A Escola de Cases é uma seção de nosso escritório que tem a proposta de analisar casos específicos realizados pelo corpo de advogados especialistas. O objetivo é mostrar como o problema de clientes é abordado e como se chega à solução mais adequada aos seus anseios e objetivos.
Com ênfase na análise de cenário e do estudo das ações possíveis, são abordadas e explicadas consultas, negociações, ações judiciais e outras formas de relacionamento com os clientes e outras partes.
Os casos expostos na Escola de Cases já estão encerrados e, por isso, podem ser discutidos publicamente.
No entanto, para proteger as partes e o escritório, os nomes das partes envolvidas não serão revelados, bem como os detalhes técnicos, quando o sigilo se fizer necessário.
O Case dessa semana é relativo ao setor de limpeza.
Um inventor individual, pessoa física, criou uma nova forma de fabricar uma peça muito utilizada no setor de limpeza empresarial e doméstica. O cliente depositou a patente junto ao INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial).
A invenção desse cliente é um Modelo de Utilidade, uma modalidade do regime de Proteção Intelectual, que tem 15 anos vigência, conforme a legislação atual.
Posteriormente, essa nova forma para fabricação do produto se tornou um padrão no mercado, sendo copiado por todos os concorrentes – de micro e pequenas empresas a multinacionais – e, evidentemente, nenhuma delas pagava os devidos royalties ao detentor da patente.
O inventor nos procurou com dúvidas sobre qual estratégia utilizar para obter os royalties.
Com base nas informações do inventor e no conhecimento de mercado, a equipe identificou uma fragmentação grande no segmento de fabricação do produto.
Em linhas gerais, existiam dois tipos de empresas:
1. Pequenas e microempresas brasileiras
2. Multinacional de grande porte e grande atividade inventiva
A principal dificuldade, nesse caso, se dava por envolver empresas muito diferentes entre si, que requeriam estratégias de abordagem específicas.
Em relação às pequenas e microempresas, a dificuldade estava nas suas localizações e em dialogar com os empresários. Além do fato de muitas dessas empresas serem informais e desaparecerem após serem procuradas por nossos advogados.
É difícil precisar o motivo desse comportamento recorrente de desrespeito à Propriedade Industrial, embora se possa afirmar que esse é um traço comum no Brasil, especialmente porque a Justiça é morosa demais e existem poucos mecanismos de proteção aos direitos de patente.
Quanto à facilidade de essas empresas desaparecerem, se conclui que ainda há no Brasil uma tendência forte de as microempresas viverem na informalidade. Isso facilita que desapareçam de um local e continuem operando de maneira irregular em outro.
É possível concluir que esse comportamento comum no mercado brasileiro desmotiva qualquer tipo de iniciativa inventiva de indivíduos ou de empresas.
No tocante à multinacional, a dificuldade enfrentada foi acessar a empresa. Devido à grande estrutura interna e hierárquica, ficava difícil acessar os centros de decisão. Além disso, é possível que empresas desse porte utilizem o poder econômico para tentar controlar a negociação, como ocorreu noutro caso que relatamos nesta seção.
Um elemento importante a ser considerado é a multinacional em questão possuir ênfase em atividades inovadoras, possuindo, inclusive, grandes investimentos no setor de P&D (Pesquisa e Desenvolvimento). Em outras palavras, é uma empresa que conhece e utiliza o regime de Propriedade Industrial cotidianamente.
Nosso cliente era um inventor individual, detentor de uma Patente de Modelo de Utilidade que estava sendo desrespeitada por companhias de origens e complexidades organizacionais diversas.
Em oposição estava o mercado como um todo, que adotou o modelo de fabricação desenvolvido pelo cliente sem respeitar seu Direito de Propriedade Intelectual.
De um lado, boa parte desse mercado era composta por pequenas e microempresas, que se recusavam a negociar e tendiam a desaparecer quando procuradas por nossos especialistas.
De outro, a empresa multinacional não apresentava nenhum risco de desaparecer, entretanto, o comportamento dos gestores da empresa era imprevisível e o desafio do escritório era se antecipar.
Diante do alto investimento necessário de tempo e energia para identificar, rastrear e acionar as micro e pequenas empresas, foi decidida a estratégia de acessar a multinacional.
Isso porque os primeiros esforços a fim de encontrar empresas menores não tinham surtido o efeito desejado e a nossa ação já era assunto comum no seguimento. Espalhou-se um boato de que o inventor da patente estava “perseguindo” empresas que utilizavam seu método de fabricação e exigindo compensação.
Foi observado com surpresa pela equipe que a narrativa dos boatos mostrava a “compensação” como algo quase ilegal e antiético. Isso reforça a compreensão de que o empresariado brasileiro sabe e se importa pouco com o regime de Propriedade Industrial.
Para acessar a empresa multinacional, a negociação direta foi opção. A via judicial seria utilizada apenas após esgotar todas as demais possibilidades.
A empresa foi notificada extrajudicialmente e foram seguidas duas linhas argumentativas:
A empresa respondeu nossa notificação, reconhecendo o equívoco e se dispondo a negociar o pagamento dos royalties devidos em prazo acordado (até o fim da vigência da patente).
Já com relação às pequenas empresas, o resultado não foi tão positivo. Muitas delas efetivamente sumiram e outras foram acionadas judicialmente. Esses casos ainda estão em discussão judicial não podem ser discutidos aqui.
O principal fator de sucesso nesse caso foi a decisão de não utilizar uma estratégia flagrantemente conflitiva quando a negociação se apresentava como um caminho.
Essa estratégia teve pontos positivos e negativos.
O positivo principal foi a estratégia de buscar negociações com a multinacional. A notificação extrajudicial foi elaborada com o intuito de convidar a empresa a negociar e não o contrário.
Como ponto negativo, é avaliado pela equipe que não iniciar a abordagem judicialmente permitiu a muitas empresas desaparecer para evitar o pagamento dos royalties.
No entanto, a ponderação comum é que, na relação entre o tempo e dinheiro despendidos e o retorno obtido, os ganhos superam, em muito, as perdas.
Além disso, o case no setor de limpeza em análise sempre foi considerado ser pouco provável receber os royalties de empresas menores. Isso, de fato, é um problema quando concluído que no mercado brasileiro o não cumprimento da lei é uma expectativa considerada razoável. Porém o cotidiano descumprimento de leis e direitos não torna esse comportamento menos grave.
A principal lição aprendida nesse caso é que há situações nas quais é necessário admitir certas perdas para atingir o ganho. E fica registrado aqui a frustração – do cliente e dos advogados – diante da facilidade de se furtar ao cumprimento de obrigações legais.
Caso possua um problema semelhante e queira uma opinião especializada, entre em contato conosco.