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O caso do biquíni de crochê baiano e as chances da brasileira Solange receber uma indenização pela violação de direitos autorais

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A peça criada por Ferrarini || Créditos: Reprodução/The New York Times Fonte: Glamurama

Em 20 de dezembro de 2018, o The New York Times publicou uma matéria que repercutiu em grande parte da mídia nacional, inclusive mereceu uma matéria no Fantástico – um dos horários mais concorridos da televisão brasileira.

Tudo começou em meados de 2012, com as férias de Ipek Irgit em uma das praias mais badaladas e bonitas do Brasil, Trancoso – BA, onde, segundo apontam os indícios, conheceu o biquíni artesanal criado por Solange Ferrarini.

Ipek, que até o momento estava sem um rumo na vida e enxergou naquela peça uma oportunidade, reconheceu também que o modelo poderia ganhar fama nas redes sociais, devido ao seu formato diferenciado e por ser bastante colorido e chamativo, com a cara DIY (artesanal) que faz a cabeça das famosas.

Após adquirir o biquíni de Solange, Ipek retornou a Nova York com a ideia de criar um protótipo na China, onde geralmente é muito mais barato fazer isso, para posteriormente revender a peça no mercado de luxo, agregando uma marca de alto impacto.

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Maria Solange Ferrarini || Créditos: Reprodução/The New York Times Fonte: Glamurama

Em 2013, foi da suposta apropriação indevida da criação de uma artesã brasileira, que nasceu a marca milionária KIINI e em 2014, revistas como a Vogue UK, Women’s Health, Elle Itália, People já estavam recheadas com modelos vestidas com o KIINI, que inclusive foi chamado de “O Biquíni mais quente do verão”.

O sucesso do KIINI era crescente e em 2015 Ipek já havia faturado US$ 9 milhões, foi então que seu advogado a aconselhou a registrar a peça em seu nome no Escritório de Direitos Autorais dos Estados Unidos.

Com o sucesso do KIINI e com registro em mãos, Ipek sentiu a necessidade de ingressar com diversas ações para coibir o uso indevido da criação que aduzia ser sua, inclusive demandou judicialmente contra grandes empresas, dentre elas a VICTORIA’S SECRET empresa com quem fez um acordo confidencial.

No ápice do sucesso em 2018 e quando já estava se sentindo vitoriosa Ipek, achou conveniente ajuizar uma ação federal contra Neiman Marcus e outras duas empresas de moda praia.

Todas as medidas judiciais trouxeram a Ipek uma exposição indesejada, que acabou tendo o pior de seus segredos revelados por sua ex-sócia Sally Wu, que a ajudou a reproduzir os biquínis de Solange.

Sally alega que em meados de 2012, recebeu o e-mail que mudou a vida de Ipek, no qual havia fotos do biquíni de Solange. Em Nova York, Sally alega que Ipek disse: “Eu preciso descobrir como copiá-lo”.

Como Sally entendia de design, produção e importação, para Ipek, seria a parceira ideal para fazer com que o produto fosse produzido por um baixo custo, mas com boa qualidade, para que o seu produto e sua marca alcançassem o almejado mercado de luxo.

Porém, a relação das sócias envolvidas foi desgastada e consumida pelo trabalho e Sally não quis mentir sobre a reprodução indevida do biquíni de Solange, pois sabia das implicações legais que tal atitude poderia acarretar.

Para comprar o silêncio de Sally, Ipek chegou a oferecer vantagens, contudo Sally manteve seu compromisso com a verdade e contou toda a história a um amigo, Doug Schmidt que a convenceu de quebrar o silêncio e contar o que sabia às empresas que foram lesadas pela mentira de Ipek.

Foi então que o advogado Jason Forge, defendendo a marca Platinum da empresa PilyQ que produz peças parecidas com o KIINI e também lesada pelas medidas judiciais de Ipek, descobriu, com o zoom, a assinatura de Solange e a origem do produto “Trancoso – BA” na foto inicial que Ipek enviou para Sally utilizar como referência para a confecção de seu protótipo.

Solange, de 61 anos, vende seus biquínis artesanais para sobreviver e se sente lesada, visto que os turistas, diferente dos moradores locais, custam a acreditar que ela é a autora do biquíni da moda.

Após a descoberta inquietante de Jason Forge, Solange assinou um acordo Neiman Marcus, para vender seus biquínis artesanais nos EUA, além de ganhar um grande investimento financeiro para brigar contra Ipek por sua apropriação indevida.

A advogada americana de Solange, Michelle Rutherford, afirma que a indenização será compatível com o lucro aferido por Ipek nas vendas do KIINI, em torno de US$ 3 a US$ 5 milhões.

Em nossa análise a brasileira Solange Ferrarini, possui grandes chances de êxito visto que o caso em destaque, vinculado ao Fashiow Law, envolve violação de direitos autorais.

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O biquíni da esquerda é o de Ferrarini, e o da direita é o de Irgit || Créditos: Reprodução/The New York Times Fonte: Glamurama

É importante dizer, que a premissa mais forte do caso em questão, são os direitos autorais de Solange que, com base nas evidências apresentadas, foram lesados, visto que em momento nenhum Ipek remunerou Solange por seus direitos patrimoniais.

Ademais, Ipek atribui à obra de terceiro, autoria falsa, o que é vedado pela legislação em vigor e é importante mencionar que no mundo, o Direito Autoral tem como principal diretriz a Convenção de Berna, que é um tratado internacional, no qual, o Brasil e os EUA são signatários, sendo que umas das premissas básicas é o princípio da reciprocidade, ou seja, o brasileiro terá a mesma proteção de direito autoral nos EUA que um americano.

Há de se considerar que que a legislação americana de direitos autorais, protege o design criativo aplicado em determinadas peças de moda, ou seja, nem todas as criações fashion são passíveis de proteção. Porém, algumas criações inovadoras da moda como o design têxtil e gráfico, podem ser protegidas, segundo a atual legislação americana que versa sobre Copyrigth.

Além disso, o Escritório de Direitos Autorais Americano, já concedeu o registro dos direitos autorais do biquíni em discussão para a Ipek, o que certamente garante a brasileira Solange um grande trunfo a seu favor, visto que a discussão recairá sobre a titularidade e não sobre a possibilidade de proteção. No que tange a comprovação de titularidade, as fotos e o e-mail divulgados por Sally são claros e evidenciam a cópia da criação de Solange por Ipek.

Também existem diversos precedentes favoráveis e tratando-se de uma legislação que adota o common law, isto é, o direito aplicado por meio precedentes judiciais, é relevante apontar que a Suprema Corte dos EUA já decidiu no caso semelhante Star Athletica vs. Varsity Brands, afirmando que: “desenhos bidimensionais aparecem na superfície de [roupas] incluindo combinações, posicionamentos e arranjos de formas, cores, linhas etc. são protegidos por direitos autorais”, como ocorre no caso do biquíni de crochê de Solange, no qual, a inovação reside justamente na combinação de cores, formas e linhas que o tornam tão cobiçado no mundo.

Em conclusão, Ipek pode negar, porém caso as evidências se confirmem judicialmente, Solange que vende seus biquínis na praia desde 1998 pode conquistar o reconhecimento mundial de seu trabalho e uma indenização milionária.

Por: Aline Brito de Souza Souto Maior

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