Recentemente houve um crescimento significativo de multas do Procon, reclamações no CONAR e até mesmo processos judiciais tendo como foco a publicidade infantil.
Essa não é uma tendência brasileira, nos canais suecos, por exemplo, anúncios dirigidos a crianças menores de 12 anos foram banidos.
Diante disso, é importante entender quais são as leis brasileiras que regulam o tema e quais são os riscos efetivos quando se busca atingir as crianças.
Em 2014, o CONANDA publicou uma Resolução (nº 163/2014) que considera abusiva a publicidade ou comunicação mercadológica dirigida a crianças como o fim de persuadi-las ao consumo de qualquer produto, por meio de:
Essa Resolução foi bastante questionada, em especial, sobre sua constitucionalidade, na época de sua publicação.
A Resolução foi até utilizada em algumas decisões judiciais, mas, em geral, acatou-se o entendimento que o CONANDA não é um órgão competente para legislar sobre publicidade e por essa razão, a publicidade dirigida a crianças continua sendo veiculada.
Esse entendimento é razoável uma vez que nenhuma das leis que fazem referência ao CONANDA indicam a competência desse órgão para legislar, a atuação está restrita à regulação da política nacional de atendimento aos direitos da criança e do adolescente.
Além disso, o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente de forma indireta autoriza a veiculação de publicidade para esse público.
Contudo, independente da Resolução do CONANDA, há no código do consumidor a previsão de proteção contra a publicidade abusiva e esse dispositivo é aquele que está sendo utilizado para fundamentar demandas administrativas e judiciais em face da publicidade infantil.
Porém, não é qualquer publicidade infantil que é considerada abusiva, razão pela qual é extremamente importante analisar a jurisprudência para entender quais são os critérios utilizados que caracterizam a publicidade infantil também como abusiva.
A publicidade abusiva não é aquela que traz informações falsas, mas aquela que tira vantagem da falta de conhecimento do consumidor ou inibe a capacidade de livre escolha deste.
O Código do Consumidor traz explicitamente essa conceituação com relação a crianças: “se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança”.
Por esse ângulo, a jurisprudência tem entendido a publicidade infantil como abusiva quando ela tem a intenção de iludir o consumidor e para tanto não basta a utilização de elementos lúdicos ou associados à imaginação, também não são considerados publicidade abusiva dar brindes simples ou alguns mais complexos, desde que possam ser comprados de forma isolada.
Os magistrados consideram a importância da participação da família em ensinar e educar as crianças, então não é qualquer conduta que caracteriza essa prática.
São consideradas condutas abusivas a indução de compartilhamento de dados em jogos e sites do anunciante, uso do CPF dos pais, estimulação excessiva ao consumo, colecionáveis em campanha de curto espaço de tempo e a venda casada, esta última por si só já é considerada ilegal, em especial, quando tem foco nas crianças.
Não obstante esse entendimento, vários órgãos passaram a entender que a publicidade específica de alimentos dirigida a crianças pode ser considerada abusiva.
Recentemente o CONAR entendeu que as campanhas de alimentos diretamente direcionadas a crianças devem ter como diretriz a transmissão de informações sobre equilíbrio e educação alimentar, promovendo hábitos saudáveis, conforme segue:
Representação nº 105/2016
Oficio enviado ao Conar pela Promotoria de Justiça da Infância e da Juventude da Capital, do Ministério Público do Estado de São Paulo, motivou esta representação, contra a campanha acima, desenvolvida em shoppings e parques pela Bimbo para promover um bolinho.
A denúncia foi encaminhada ao Ministério Público pelo Instituto Alana, que entende que a ação vai contra a legislação.
Em sua defesa, a anunciante informou ter divulgado seu produto, que é direcionado a crianças menores de doze anos, em conformidade com as normas legais e de autorregulamentação vigentes, e com participação nas ações sempre condicionada à autorização expressa dos pais.
A autora do voto vencedor propôs a alteração, reconhecendo a possibilidade de realizar ações de divulgação de produtos alimentícios, desde que tendo como diretriz a transmissão de informações sobre equilíbrio e educação alimentar, promovendo hábitos saudáveis. Seu voto foi aceito por maioria.
Nesse mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça – STJ proferiu decisão no Recurso Especial nº 1.558.086 em que entendeu como publicidade abusiva o marketing de alimentos direcionado a crianças, fundamentado no artigo 37, parágrafo 2º do Código de Defesa do Consumidor.
Há de se considerar, ademais, que existem Estados e Munícipios tentando regular a questão, por exemplo, o Munícipio de Jacareí no Estado de São Paulo promulgou lei que proibia comunicação mercadológica dirigida ao público infantil e fundamental na rede municipal de ensino. Essa lei foi considerada inconstitucional.
O mesmo aconteceu no Estado da Bahia, que promulgou lei proibindo a publicidade infantil de alimentos pobres em nutrientes, esta lei está sob discussão no STF e a decisão, com certeza, trará uma posição mais clara sobre o tema.
No momento de fazer publicidade dirigida às crianças é importante ser razoável para não ficar configurada a abusividade, as condutas aqui descritas como abusivas, devem ser claramente evitadas, pois existem decisões recorrentes nesse sentido.
Além disso, o segmento alimentício deve ter cuidado redobrado, até que tenhamos uma posição mais clara da jurisprudência.