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Invenções criadas por Inteligência Artificial. Quem é o inventor?

Imagem de Mão robótica tocando em um teclado de computador.

Por Marcio Tabata

A discussão de quem seria o inventor de uma patente de uma invenção gerada por Inteligência Artificial (IA) se tornou algo concreto em agosto de 2019, quando foi anunciado o depósito de dois pedidos de patentes de invenções que teriam sido geradas pela Inteligência Artificial chamada DABUS[1] de forma autônoma, ou seja, sem qualquer intervenção humana através de orientação ou parametrização.

Tais pedidos foram depositados inicialmente no Instituto Europeu de Patentes (IEP) e no Escritório de Patentes do Reino Unido (UKIPO), que inicialmente rejeitaram os pedidos. Nas argumentações, tanto o IEP[2] quanto o UKIPO [3] alegam que seria necessário que um humano fosse designado como inventor. No site do The Artificial Inventor Project[4] são apontados os status[5] dos casos em que DABUS foi nomeada como inventora.

Adicionalmente, de acordo com The Artificial Inventor Project, o pedido de patente depositado através do Tratado de Cooperação em matéria de Patentes (PCT), publicado sob o número WO 2020/079499[6], em 23/04/2020, foi o primeiro em que uma IA foi designada como inventora em um pedido do PCT. O pedido tem em seu campo de inventor a seguinte descrição: DABUS, The invention was autonomously generated by an artificial intelligence. Apesar do fato inédito, um ponto curioso é que na publicação consta o endereço da IA. Seria esse endereço o local onde estão os sistemas que dão “vida” à DABUS?

Afinal, a IA pode ser considerada uma inventora?

Em geral, as legislações não estão preparadas para responder se uma IA poderia ser declarada como inventora. No Brasil, a Lei 9.279/96 – Lei da Propriedade Industrial (LPI) em seu Art. 6º diz:

Art. 6º Ao autor de invenção ou modelo de utilidade será assegurado o direito de obter a patente que lhe garanta a propriedade, nas condições estabelecidas nesta Lei.” (grifo nosso)

Se considerarmos que o inventor é um autor, se faz necessário trazer a conceituação de autor de acordo com a lei 9.610/98 – Lei de Direitos Autorais, que define em seu Art. 11 que “Autor é a pessoa física criadora de obra literária, artística ou científica”.

Adicionalmente, em diversos trechos, a LPI deixa a entender que o inventor está associado à pessoa física, atribuindo características intrínsecas de indivíduos, como, por exemplo, no próprio Art. 6º, em seu § 4º que aponta que “o inventor será nomeado e qualificado, podendo requerer a não divulgação de sua nomeação”.

A Juíza Caroline Somesom Tauk aponta em seu artigo “A era das máquinas criativas: a proteção patentária de invenções”[7] outros trechos da LPI que trazem a ideia de inventor associado a uma pessoa física, como no Art. 12, que menciona o “consentimento do inventor”, ou o Art. 93, que trata da relação entre o empregado ou prestador de serviço autor da invenção e o empregador.

Imagem que mostra um robô analisando dados.

E se uma AI não é considerada uma autora, ela pode ter uma patente?

A resposta de como seria analisado um pedido de patente, depositado no Brasil, tendo uma IA como inventora, é um exercício que parece não ter uma resposta simples.

Diversos argumentos pró e contra a nomeação de uma IA como inventora parecem fazer sentido, mas até o momento, as decisões estão caminhando para a não aceitação de tal nomeação. Aparentemente, para que nomeação de uma IA como inventora seja aceita, serão necessários ajustes nas legislações para que essa nova revolução tecnológica seja prevista e abordada.

Um fato importante para a tomada da decisão seria ouvir as partes envolvidas. Quais argumentos DABUS apresentaria para que ela pudesse ser nomeada como inventora? No momento, teremos que aguardar as decisões dos humanos sem ouvir a IA.

 

[1]O que é DABUS? http://imagination-engines.com/iei_dabus.php

[2]Decisões do IEP sobre os pedidos EP 18 275 163 e EP 18 275 174 disponível em:  https://www.epo.org/news-events/news/2020/20200128.html

[3]Decisão do UKIPO sobre o pedido GB1816909.4 disponível em: https://www.ipo.gov.uk/p-ipsum/Case/ApplicationNumber/GB1816909.4 e decisão do UKIPO sobre o pedido GB181816.0 disponível em: https://www.ipo.gov.uk/p-ipsum/Case/ApplicationNumber/GB1818161.0

[4]Site do projeto The Artificial Inventor Project: https://artificialinventor.com/

[5]Disponível em: https://artificialinventor.com/patent-applications/

[6]Disponível em: https://patentscope.wipo.int/search/docs2/pct/WO2020079499/pdf/buyRRvqKWcIh6-r9dEHjcddIo5t-0ZpBsl3fGUXbCcbPzyNm5TnxjASEmvTwSEzE9FSfvuUL2nv1mnndQHczCpvYwk3I2pX-szw8KPC7hs0CN4mWIrt4ndPNf1eTjtEj?docId=id00000053609665

[7]Disponível em: https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=3554433