*Por Jonatas Sousa.
Em meados de maio de 2014, uma famosa grife brasileira amealhava duras críticas por colocar à venda camisetas estampadas com a hashtag #somostodosmacacos. Isso porque a campanha havia sido lançada nas redes sociais logo após um ato de racismo sofrido pelo jogador de futebol Daniel Alves durante uma partida. Na ocasião, arremessaram uma banana contra jogador brasileiro enquanto ele se preparava para bater um escanteio, mas Daniel respondeu de forma emblemática: descascou a fruta e comeu. A atitude causou repercussão dentro e fora do mundo esportivo e ensejou a criação da hashtag, que foi massivamente compartilhada em todo o mundo. Poucas horas depois o lema da campanha já estampava as camisetas da marca de roupas, o que motivou as críticas, pairando sobre ela a peja de oportunista por querer lucrar com o episódio de racismo.
No mesmo ano, uma outra hashtag também ganhava notoriedade nos EUA pela voz de milhares de manifestantes norte-americanos que saiam às ruas para protestar contra a violência direcionada às pessoas negras, a hashtag #BlackLivesMatter. A campanha teve origem nas redes sociais no ano de 2013 como uma reação à absolvição de George Zimmerman na morte a tiros do adolescente afro-americano Trayvon Martin. Nos anos seguintes a campanha reuniu ainda mais apoiadores. Em maio de 2020, após a morte de George Floyd por um policial, uma onda de protestos varreu as ruas e redes sociais sob a força da hashtag #BlackLivesMatter. Hoje o movimento BLM é símbolo da luta contra o racismo e outros tipos de discriminação.
Ocorre que nesses tempos do chamado ativismo de marca, com empresas que se engajam em algum tipo de causa social, fica conhecido com uma imagem negativa, visto apenas como tentativa para conquistar consumidores. Por isso, é preciso ter cautela para que movimentos como o #BlackLivesMatter não sejam reduzidos a meras campanhas publicitárias para impulsionar as vendas como ocorreu com a campanha #somostodosmacacos. Isso porque o que aconteceu a essa campanha traduz uma prática usual de mercado, que normalmente tende a se aproveitar da força e notoriedade desses movimentos globais com finalidades estranhas ao movimento em si, o que pode resultar no esvaziamento da causa.
A título exemplificativo, nos Estados Unidos, houveram pelo menos 13 pedidos de registro de marca de pessoas não relacionadas ao movimento, todos rejeitados pelo USPTO, órgão responsável pela análise de pedidos de marca, fundamentados no argumento que a expressão já era amplamente usada e assim não passível de exclusividade.
Para além do esvaziamento da causa, pode ocorrer confusão relativa a doações, o que aconteceu, inclusive, com o movimento #BlackLivesMatter que foi confundido com a organização Black Lives Matter Global Network.
Uma das formas de manter intacta a causa e a força do nome, assim como proteger dessas confusões é efetuar o pedido de registro de marca e o registro do nome de domínio. Diferente do que grande parte das pessoas imagina, movimentos sociais como o BLM também podem e é recomendável que protejam seus sinais distintivos, possibilidade que não se restringe apenas a empresas com fins lucrativos.
Qualquer pessoa ou grupo que desenvolva algum tipo de trabalho ainda que social, deve cuidar de registrar e proteger o sinal que o identificará perante o público. Com o registro, a marca poderá ser usada de forma exclusiva por seu responsável, que também terá o direito de impedir que terceiros a utilizem sem autorização ou busquem imitar o nome ou induzir o público a erro. Desse modo, será possível aos responsáveis gerir a forma e a finalidade como o seu nome é utilizado, mantendo assim a força de seu nome e a profundidade inicial da sua causa.